A temporada masculina de Inverno 2020/21 foi marcada pela redefinição dos códigos que definem a masculinidade na moda, pelo menos, vista nos últimos cem anos.
Moda sem gênero e tomboy (aquela que aparece peças típicas masculinas no look feminino) vem sendo abordadas na passarela há algum tempo. Mas pouco temos visto o padrão masculino ser desconstruído.
Quando fiz meu trabalho de conclusão de curso, em 2018, uma questão que me incomodava era a tal moda sem gênero, só se falava nela, mas as marcas que faziam moda sem gênero eram tão sem graça pra mim. Parece que o armário masculino continuou o mesmo, só que liberou camiseta e calça larga na cor preto, branco e cinza mescla para mulher usar (digo em um âmbito de moda, porque em uma perspectiva social muitas vezes mulheres ainda precisam performar feminilidade no vestir). Eu queria fugir dessa perspectiva chata unissex ou agênero e criar moda para um corpo falante, porque afinal, roupa fala e é uma forma de se expressar. Porque não tem brilho, tecidos leves, bordados, modelagens elaboradas quando se fala de roupa sem gênero? Exploração de tecidos, cores e matérias-primas...
Finalmente chegou a hora e a Gucci abriu a temporada de moda masculina com louvor.
Alessandro Michelle, diretor criativo da Gucci, que tem feito um trabalho lindíssimo desde sua entrada na maison (já falei aqui), nos convidou a “revisar e reconsiderar” as características da masculinidade através de uma jornada alegórica de roupas de volta à infância. A moda hegemônica masculina foi posta de lado e apresentado uma moda doce, mas com a essência fashionista e styling ousado de Michelle.
Na passarela, os modelos caminhavam ao redor de uma réplica gigante do pêndulo de Foucault, imprimindo a ideia de que nossa percepção do tempo não é linear, especialmente quando falamos do relógio da moda. Uma sacada genial vindo de Michelle que sempre explora a moda de outras épocas em suas coleções para contar histórias através da roupa.
"Não sinto nostalgia... Não me apego ao passado... Uso o passado porque o passado é um espaço muito interessante." Disse o designer.
Os looks lembram o Kurt Cobain para vocês também? Eu amo!
Bom, mas não só de Gucci é feita uma temporada de moda.
A quebra de um padrão de guarda-roupa masculino básico e restrito se repaginou em praticamente todas as marcas menswear, o que com certeza diz muito sobre o comportamento de moda futuro por um corpo livre de estereótipos, quem sabe?
Em ordem, Random Identities (marca criada há pouco por Stefano Pilati, ex-diretor criativo da YSL, que já vinha desmistificando o ranço identitário masculino na moda de forma sútil), Dior Men, J.W. Anderson, Rick Owens e Loewe.
Tem também muitos outros que para quem quer adentrar ao universo, indico vogue.com/fashion-shows, vai lá, e me chama para conversar!