Há alguns dias viralizaram imagens do street style chinês nas redes sociais, vindo a calhar para pautarmos sobre a teoria bubble up na moda, que é a contrária ao trickle down que conversamos por aqui na última coluna.
A teoria Bubble up refere-se aos estilos originários dos movimentos de rua e que acabam instigando a curiosidade e a pesquisa de criadores e de grandes marcas de moda, que posteriormente criarão suas roupas inspiradas nestes movimentos, funciona de baixo para cima e não de cima para baixo, como o trickle down. É o exemplo da cultura punk que Vivienne Westwood trouxe das ruas para a passarela nos anos 70, e atualmente o que chamamos de streetwear ou street style como Virgil Abloh faz com a marca Off-White.
Mas não se engane, os vídeos parecem street style chinês, eu mesma achei que fosse, até descobrir o grande marketing de influência por trás deles. Na verdade, um grupo de fotógrados de street fashion faz os vídeos em parceria com modelos e influencers chineses, sendo postados originalmente na mídia social Douyin, o TikTok de lá. Quer dizer que esse ar de espontaneidade não passa de business, onde as marcas arranjaram uma forma de serem desfiladas fora da passarela.
O vídeo que se tornou viral no Brasil vinha acompanhado de comentários “como os chineses são estilosos” ou “queria me vestir assim”. Parece inofensivo, mas fazer a nossa comparação com o street style chinês (que não é na verdade street style, já começa por aí) é um pouco complexo visto que temos disparidades econômicas, sociais, e culturais com eles, e não só entre os dois países, mas entre nós mesmos dentro do Brasil. Uma vez que estamos vivendo dentro da lei ou no interior de uma determinada cultura não há possibilidade de nossa escolha ser inteiramente “livre”, a escolha das roupas no vestir se ajustam às expectativas normativas do núcleo que estamos inseridos, e ainda dentro de uma sociedade alicerçada por regras e padrões. Além do mais, o conceito de moda nunca foi entendido culturalmente no Brasil, assim como a roupa não é vista como forma de expressão.
A moda desde a criação do seu conceito e entendida como sistema - no final da Idade Média - funcionou como mecanismo estético de distinção social, em meados do século XX veio a parecer um pouco mais democrática e aberta. E muito se fala na moda democrática, mas será que estamos vivendo uma democracia na moda? É certo que hoje um desfile chega na palma da mão de quase todos em tempo real com o avanço das mídias digitais, mas há ainda uma estrutura que resulta em preconceito com um simples look alheio na rua, e que é a mesma estrutura que colabora para/com as distinções sociais. Vai ver, não é só sobre roupa!?